Uma formidável tempestade


"Nessa tarde, quando regressávamos, uma formidável tempestade surpreendeu-nos na mata. O mar de frondes verdes encapelara-se de súbito, estopetado por ventania louca, que ululava com voz rugidora e ameaçante. Os pegões eram contínuos e ia no ar a zanguizarra das franças atritadas e o remoinho das folhas soltas e dos galhos partidos. Por vezes, tinha-se a impressão de que as árvores não resistiriam às lufadas mais fortes, que lhes vergavam os tronos e torciam as ramas, abrindo clareiras por onde se divisavam nesgas de um céu de chumbo. E fez-se a noite na floresta, uma noite espessa e tormentosa, entrecortada apenas de onde a onde pela fosforescência lívida dos relâmpagos. As bátegas caíam pesadas enquanto os trovões restrugiam sobre as nossas cabeças, aumentando a atoarda do furacão em que se ouvia o alarido de mil bocas em rinchavelhadas histéricas, uivos, urros e assobios. Não seria maior a algazarra se uma multidão de gigantes andasse às soltas, resfolegando uma pocema de guerra.
Encolhidos entre as sapopemas de uma sumaumeira,  tínhamos as caras de quatro náufragos e olhávamos uns para os outros. Malila, mais calma, observou-nos: - Isto é a mãe do mato que está zangada.
A seguir, abrindo a cestinha a tiracolo, começou a esfregar-se pacientemente com a tinta vermelha do carajurú que a protegeria da ação do raio". Gastão Cruls (1888-1959). A Amazônia misteriosa. 6. ed. 1953. p. 183-184.



Árvore  com sapopemas.
Franz Keller-Leuzinger. Voyage d´exploration sur l´Amazone et le madeira. 1874.

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